Viver Devagar

Há uns dias vi uma foto publicada no Facebook por um amigo. Era uma belíssima foto de família, a preto e branco, com o pai deitado na terra, nas ervas, com dois filhos sentados em cima de si, um nos joelhos e outro no peito. Do lado esquerdo estava a mãe, igualmente sentada no chão, com um pequeno no meio das pernas cruzadas e um bebé ao colo.

A foto sugeria ser Verão, no campo, e o casal e quatro filhos estavam à sombra, relaxados, descontraídos.

Aquela fotografia em particular transmite uma tal sensação que as centenas de comentários, aos quais juntei o meu, iam no mesmo sentido – que maravilha!

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Comentei alto, ai coitada desta mãe, 4 rapazes! e levei logo com um coitada porquê?!, como se eu estivesse a dar a entender que ter 4 filhos fosse uma tragédia. Coitada porque se eu frito com 3 imagina ela com 4.

E fiquei a pensar. Pensei como nos anos 50, ou 60, ter 4 filhos não é o mesmo que agora. O ritmo de vida era outro, mesmo na cidade. Sobretudo na cidade.

Agora é a loucura de exigência de trabalho com X horas no mínimo e prazos para ontem; a loucura de horas no trânsito; do estacionamento ou falta dele; no crosse para ir buscar este e levar aquele para outro local; de notificações a cair no computador e telefone, responder aqui, comentar acolá.
E a corrida para chegar a horas de manhã à escola e para ter tudo jantado idealmente antes das nove e meia, faz a digestão na cama, lá para as dez. E as respostas tortas de quem tem de gerir o stress, o seu e o dos outros, que são pequenos e não têm culpa nenhuma, ou até têm que estão a ficar uns mal criados e isso é que me faz trepar as paredes e passo o tempo a respirar fundo e a deitar as mãos à cara, a pensar na nódoa de educação que devo estar a dar, a culpa é minha só pode. E a culpa e o ressentimento e coitada daquela mãe com 4 filhos, se eu frito com 3 imagina ela com 4.

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Vivemos demasiado depressa, com uma sensação de urgência nos consome por dentro – falo por mim. O café não ajuda, dá aceleração cardíaca, mas sem isso estava boa para dormir profundamente e acordar 100 anos mais tarde, fresca e airosa – finalmente!

E depois tropeçamos numa família que não é dos anos 50 ou 60, é de 2017. 4 filhos também, meio meio, menino menina, e que em plena semana vão acampar para uma praia deserta no Verão primaveril tão inusitado. E montam tenda e jantam e ainda abrem uma ou duas garrafas de vinho para celebrar os 37 anos da mãe. E têm estampada na cara a mesma expressão de quem curte a vida a cada momento e o facto de viverem na cidade não os impede de curtir a família, fazer pão, ketchup, bolachas, massa, jantares semanais com e para amigos ou plantar os seus legumes. Esta família existe e é tão extraordinária que fiz uma entrevista para tentar perceber o seu segredo.

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O segredo está agora também nas (entre)linhas do livro que se chama… Viver Devagar 😉

Tenho o privilégio de já o conhecer porque fui uma sortuda – a Maria convidou-me a escrever um artigo para o seu livro 😊

Tenho curiosidade de o ter nas mãos para me deixar imbuir deste espírito relaxado e calmo e tentar viver mais devagar. É uma arte ao alcance de poucos, suspeito que nunca chegarei sequer aos seus calcanhares (além de que o conforto até é uma prioridade cá em casa, já tive a minha dose de tendas 😜 ), mas a sua sábia filosofia vai fazendo caminho…

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